segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Caso Clínico



Caso clínico

  Trabalhamos desde 1984 com mulheres vítimas de violência. Esse trabalho começou no Rio de Janeiro, ligado ao IBRAPSI, Instituto Brasileiro de Psicanálise, Grupos e Instituições. Fazíamos atendimento usando terapia focal baseada na metodologia desenvolvida por Hector Fiorini.

  Usávamos um único foco em níveis diversos − a situação trazida por um paciente em que a "porta de entrada" fosse realmente uma série de sintomas somáticos (taquicardia, palpitações, falta de ar, tonturas), desencadeados num segundo nível pela ansiedade ou angústia frente a uma situação especifica traumatizante.
  Como delimitação do foco, utilizávamos a sintomatologia apresentada.
  O conflito atual na maioria das vezes era localizado, geralmente de origem somatoforme[S1] : insônias, cefaleias tensionais, náuseas, vômitos, diarreias.  Esses sintomas eram conectados às situações traumáticas vividas.
  Nesses casos que envolviam situações traumáticas, a comunicação inicial de que focaríamos o sofrimento psíquico trazido era eficaz. Sua comunicação era geradora de tranquilidade. Seu sofrimento era acolhido.
  Dizíamos também que poderia haver uma possibilidade de diminuição de seus sofrimentos.
  Essa intervenção também ajudava a estabelecer um diagnóstico. As pessoas com estresse pós-traumático aceitavam esperançosas essas intervenções, e seu sentimento era de alívio.
Aprendemos a usar essas intervenções verbais com maior precisão com o passar dos anos.
  Em 1988, estudando Reich no Centro Orgonômico W. Reich do Rio de Janeiro, introduzimos alguns “actings” da vegetoterapia caracteranalítica. Foram extremamente úteis e eficazes, principalmente os que levavam a uma expressão emocional mais forte. 
Logo depois acrescentamos a análise do caráter como método. Utilizávamos principalmente as intervenções diretas sobre os traços de caráter que eram ligados diretamente ao narcisismo secundário. Esclarecíamos que esses traços dificultavam a comunicação com as outras pessoas, trazendo sofrimentos para si, mas que poderiam ser evitados com a conscientização desses traços. 
  Essas intervenções, quando bem-sucedidas e apropriadas facilitavam a adaptação, a inserção social. O sentimento finalizador era o de segurança e a atitude de uma maior assertividade.
Constatamos hoje que a capacidade de resiliência aumenta quando o narcisismo secundário diminui.
  Com o passar do tempo esse método foi elaborado. Atualmente, utilizamos o movimento ocular de lateralização, de acordo com o método do EMDR, elaborado por Francine Shapiro.
Continuamos a utilizar a comunicação verbal oriunda da metodologia proposta por W. Reich e adaptada por nós.
   Vamos nos ater a um atendimento especificamente de 2008.
  Algumas mulheres que perderam os filhos assassinados souberam, através de uma ONG, desse trabalho e vieram nos procurar para atendimento.
Esse atendimento é individual. Entendemos que principalmente para esse tipo de situação um ambiente sigiloso e que transmita confiança é extremamente importante.
  A mãe que foi atendida por mim estava em grave estado de sofrimento. Presenciou os assassinatos. Uma das vítimas era seu filho de 16 anos.
Essa situação terrível já havia acontecido há um ano. Ela havia presenciado um outro assassinato.
  Ela, então minha paciente, estava muito abatida e com um aspecto muito depressivo. Buscava desesperadamente alguma forma de entendimento para o que tinha vista e para seu sofrimento.
Estava, na ocasião, com 35 anos, mais um filho de 12 anos. Os dois do mesmo pai. Na ocasião estava separada do marido.
  Trabalhava como empregada doméstica em um bairro afastado de sua comunidade. Gostava de seu trabalho. Não gostava da distância e dos meios de transporte urbano.
Estava saindo de casa, rotineiramente, às 4h30min da manhã, quando perto da sua casa viu uma movimentação estranha para a hora. Logo depois percebeu o que estava acontecendo. Execução sumária. De muito perto viu os assassinatos. Lembrava-se dos gritos, do som dos disparos. Não era a primeira vez que isso acontecia. Nos últimos cinco anos havia testemunhado um assassinato uma outra vez. Em um espaço mínimo de tempo presenciou algumas cenas de violência, incluindo dois assassinatos, sendo que o último do próprio filho.   
  Havia tentado esquecer os disparos, os cheiros, os outros sons.
Antes do último acontecimento traumático tentava negar o acontecimento anterior, acreditando na impossibilidade de um novo acontecimento. Usava − muito comum em situações traumáticas − o mecanismo de defesa de negação.
Esse mecanismo de defesa consome muita energia. A pessoa corta várias possibilidades de troca afetiva. Muitas vezes, dependendo do grau de negação,  entra num estado hipomaníaco. O quantum de energia utilizado na negação é tão grande que somente o mecanismo de defesa do ego não consegue dar conta da situação; nesse momento, quando mais angústia é gerada, sintomas são fabricados e na maior parte das vezes um quadro sintomático como esse conduz a[S2]   uma leve hipomania.
Leve por não surgir em todos os momentos, por estarem, os sintomas hipomaníacos, circunscritos a determinados momentos de sua vida cotidiana, a determinadas atitudes, não exigindo um quantum muito grande de energia. Ou seja, ainda sintoma.
Quando ouviu os tiros novamente e percebeu a movimentação, entrou em pânico. O que viu a seguir, seu filho, fez com que entrasse num estado de pânico próximo do colapso.
Pelo seu relato o choque emocional durou aproximadamente dois meses. Não sentia sabores, cheiros. Dormia muito pouco, sempre acordando três horas antes do tempo em que aconteceu a tragédia. A partir daí, em qualquer lugar que estivesse no mesmo horário, se dormia acordava sobressaltada. Depois de algum tempo passou a não dormir mais. Estava insone por volta de três meses.
  Além disso se alimentava muito pouco. Não tinha fome e praticamente não sentia o sabor dos alimentos, com exceção dos altamente calóricos, de sabor adocicado.
  Já havia tentado consultar um médico num posto de saúde, mas havia desistido.
A relação com seus filhos estava se deteriorando em pequenas desistências. Não conseguia investir nenhum afeto em nenhuma situação. Estava completamente transtornada e bloqueada emocionalmente. Suas relações e comportamentos eram mecânicos, sem vida.
Antes desse último trauma e depois dos outros seu comportamento era agitado. Antes desses acontecimentos descrevia-se como uma mulher ativa, alegre.
  Gostava de estar com os filhos, namorar, dançar, ir à praia, estar com as amigas. Sua vida afetiva e social era rica. Contava com ajuda e com disposição para ajudar outras pessoas.
Um dos sintomas do estresse pós-traumático é a busca descontrolada. A pessoa quer se livrar de seu sofrimento de qualquer forma. Sua busca, se não ficarmos atentos, pode não se diferenciar da errância psicótica.
A diferença é que na errância psicótica não há busca para respostas específicas e sim necessidade de fugir de algo que não se sabe[S3]  somente é representado por uma angústia imensa. Pela angústia, acontece a cisão psicótica. 
  Na busca do estresse pós-traumático a pessoa só consegue ouvir suas vontades. Fica distanciada de suas necessidades afetivas pelo bloqueio emocional e suas vontades ficam em evidência.
  Chamamos de necessidade. Por exemplo, a alimentação, básica para a sobrevivência tanto emocional como biológica. E vontade é o que já tem uma referência cultural mais forte. Como uma mulher grávida que diz estar com vontade de comer determinada coisa e só aquela coisa, se afastando da fome específica. Na fome específica (mulher mais genitalizada) um grupo de alimentos está referenciado a ela. Em contato com sua potência a mulher grávida se satisfaz com qualquer alimento pertencente a esse grupo. Atos ligados mais à vontade que a necessidades empobrecem.
  Como a vontade é muito ligada ao narcisismo secundário sobre verdadeiros bombardeios da cultura que a pessoa está inserida, e através do caráter ela se cumpre, é o caráter que, como espelho dela, é a instância psíquica responsável pela sua expressão como forma defensiva ou como forma de expressão propriamente dita.
Um traço de caráter como a persistência pode ter como polo defensivo a teimosia. Vemos os traços de caráter como uma moeda cara e coroa, onde muitas vezes só a defesa aparece. Isso significa que essa defesa está pesada energeticamente. Essa pessoa só tem um determinado funcionamento à sua disposição. A couraça se enrijece.  
Se existe muita energia se movimentando, produzindo mal-estar, ela está presa a determinados lugares no nosso corpo. Podemos ler esses tipos de movimentos como sintomas.
  As pessoas com psicoses não desenvolvem sintomas de estresse pós-traumático, mesmo passando pelas mesmas situações traumáticas. Não existe um caráter constituído, estruturado, capaz de sustentar tanto. Por isso, seu funcionamento é outro. Produzem cisões correspondentes a seu sofrimento.
  A pessoa que responde dessa forma ao trauma, produzindo tantos sintomas, já construiu um caráter específico. O caráter ou traços mais fortes desse caráter sustentam o trauma.
“No estresse há dois componentes distintos: o sistema neural e o sistema hormonal. O componente neural do estresse é controlado pelo sistema nervoso autônomo. É dividido em duas subpartes: sistema simpático, que se ativa durante o estresse, e o parassimpático, desativado durante o estresse” (Berns, G. O Iconoclasta, 2008, p. 82).
  Voltando a nossa paciente. Ficou claro na primeira entrevista que ela sentia uma culpa imensa pela situação. Achava que não havia dado atenção suficiente ao filho, que se não tivesse se omitido no primeiro momento de seu trauma, quando viu o  assassinato anterior, poderia ter salvado a vida do filho. Mas, na realidade, estava escuro e não viu de tão perto a ponto de identificar os assassinos.
  Dessa forma, culpando-se, trazia para si toda a situação traumática, mudando de posição. De vítima passava a maior orquestradora da sua própria história. Como não tinha como intervir durante a situação traumática, construiu uma história de culpas onde podia ordenar e entender. Por pior que fosse, estava no controle. Mesmo que ilusoriamente. Necessitava falar disso várias vezes, numa tentativa de ver outros ângulos onde pudesse voltar atrás.
Foi estabelecido entre nós que começaríamos com o trabalho ocular de lateralizaçao. Ela sentada seguindo meus dedos − a técnica do EMDR, adaptada à terapia reichiana.
  Como se sentiu amparada por mim, na primeira sessão, depois de duas entrevistas, conseguiu entregar-se a um choro profundo. Percebi que sua garganta se soltou um pouco, suas mandíbulas muito retesadas afrouxaram-se. Durante esse momento de entrega às suas emoções, conseguiu gritar e socar com desespero. Seu peito também começou a se manifestar junto com seu diafragma. Sentiu-se mais tranquila depois dessa primeira sessão.
  Atendemos três vezes na semana, nesse primeiro momento, durante um mês. Dessa forma o   vínculo de confiança torna-se mais fortalecido e a pessoa consegue uma entrega maior.
  Na semana posterior continuamos com nosso trabalho. Ela lembrou-se de outros detalhes. Cor da roupa de dois outros garotos que foram assassinados. Cor da roupa dos assassinos. Sentiu muita raiva e conseguiu socar durante um bom tempo, até ficar exausta. No final dessa sessão conseguimos ajudá-la a enfrentar sua impotência.
  É muito importante ficarmos com a orientação de Reich. Trabalhar, dentro do ponto de vista econômico, com afetos e quantum de afetos. Assim, trabalhamos as dificuldades emocionais ligadas ao acontecimento. Vamos diretamente à dificuldade e ao lugar em que está localizada no corpo. Além de mostrarmos que estamos entendendo, ajudamos a pessoa a se conectar mais com seu corpo. Ajudamos a que tenha maior controle de si mesma através da percepção. Dessa forma as pessoas se sentem realmente mais plenas e capazes de lidar com situações difíceis. 
  Ficando somente com a resolução dos sintomas, corremos o risco de perder a eficácia do processo, porque acreditamos que o caráter como um todo tenha uma função muito importante em tudo isso. Só um caráter bem estruturado é capaz de sustentar tantas situações traumáticas. Fica, para nós, muito claro que é através dele que nos relacionamos. É realmente, como diz Reich, nossa forma de estar na vida.
  Os sintomas podem funcionar no início da terapia como um gatilho. Dessa forma, puxam as emoções represadas. Abordando os afetos diretamente ajudamos a pessoa em dificuldades a encontrar o sentido das representações que estão vinculadas a eles.
Depois das seis primeiras sessões, sentimentos como culpa e emoções como a raiva e o medo diminuíram muito. Os sintomas como vômito e náusea acabaram. Seu sono, embora entrecortado e com muitos pesadelos, melhorou.
  Trabalhamos o sentido afetivo nos pesadelos. Pegamos sempre a emoção predominante no sonho ou ligada a ele e a partir daí desenvolvemos um trabalho de desconstrução desses afetos que pairam e seguram uma determinada situação.
  Depois do trabalho com os sonhos, nas últimas sessões, trabalhamos os traços de caráter envolvidos nesse conflito. Através da conscientização da sua arrogância, conseguimos que percebesse outros traços envolvidos como insegurança em determinadas situações, por exemplo. Conscientizou-se facilmente de outros traços como a competitividade e percebeu quantas vezes eles atrapalhavam sua comunicação com os outros e consigo mesma.
  A partir daí pôde fazer o luto. Sua apatia acabou e todos os sintomas ligados ao estresse pós-traumático também.
Percebe seus traços de caráter através de sentimentos desagradáveis. Quando eles começam a se manifestar percebe o que o motivou e também, menos vezes que a percepção, faz o movimento contrário.
  Em nossa experiência clínica, passamos a adotar o critério de definir com o paciente o momento do término.
  Assim, nos casos em que o paciente efetivamente apresenta uma situação de crise, intensamente motivado para a psicoterapia, com estruturação de caráter satisfatória (avaliada pelos traços que aparecem), o trabalho tem um final satisfatório para ambos.
  No caso dessa paciente, grande parte desse sucesso terapêutico se deveu à história. Foi uma criança que teve pais amorosos, liberdade de expressão e uma vida, até o início da vida adulta, segura economicamente. Nasceu e viveu até os 17 anos numa pequena cidade do interior, com pais presentes e amorosos. Mudou-se para o Rio de Janeiro, ao engravidar-se de seu namorado.   Como ele já morava no Rio, casou-se e veio morar com ele. Logo depois começou a trabalhar como empregada doméstica. Era um lugar onde podia ficar com seu filho. Construiu um trabalho agradável e baseado em sentimentos como respeito mútuo, solidariedade, etc.
  O mesmo não aconteceu com seu marido. Começou a abusar de álcool e ter um comportamento arriscado em todos os âmbitos de sua vida. As brigas do casal ficaram constantes até que, logo depois do nascimento do segundo filho, separaram-se.
  Portanto, em nossa proposta de psicoterapia, procuramos avaliar de inicio a possibilidade de sua aplicação (indicação). Depois, se a pessoa é indicada para esse processo, ou seja, se tem um caráter estruturado, se está suficientemente motivada e se a situação traumática é recente, contratamos a forma de psicoterapia. Um mês com três sessões semanais. No segundo mês, uma sessão semanal e a partir daí se o tratamento foi bem sucedido uma sessão de avaliação a cada três meses, durante um ano. Após esse período uma sessão anual durante dois anos. Após dois anos a alta é estabelecida.
  Caso o tratamento não tenha atingido suas metas, avaliamos as causas e indicamos outro modelo de tratamento psicoterápico.
  Essa paciente obteve alta, depois de passar por todo o processo. Atualmente, sente-se capaz de continuar no controle da sua vida. Recuperou sua capacidade de sentir e de diferenciar os sentimentos, ligando-os aos seus fatos cotidianos.


quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Pornografia faz bem para o Relacionamento?


Pornografia faz bem para o Relacionamento?

  É sabido que muitos homens (e mulheres também) gostam de apreciar um filme menos ortodoxo e mais objetivo, também conhecidos como filmes para adultos ou ainda, filmes pornôs,mas o que não se sabia até momento era qual o nível de influência deste comportamento pornográfico na qualidade de entrosamento e relacionamento do casal.
  De acordo com o Dr. Sandro Tubini (psicólogo e psicoterapeuta da capital paulista), "Esta situação não é exclusiva das mulheres e sim do ser humano. Toda vez que alguém se sente trocado, seja por um vídeo pornô, por um jogo de futebol , por uma novela ou por um vibrador, ocorre um motivo evidente para insegurança. O fato marcante nesta pesquisa é o sentimento de rejeição que aplaca e afeta diretamente a relação, a felicidade e por consequência a auto estima, natural a qualquer sexo".

Mulheres são mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas globais


Mulheres são mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas globais


  Fatores socioeconômicos e culturais potencializam as vulnerabilidades do sexo feminino aos desastres provocados pelos eventos climáticos extremos, avalia Úrsula Oswald Spring, do IPCC

MEC Faz Parceria com Conselho Federal de Psicologia para Combater a Violência nas Escolas



  Para enfrentar a violência nas escolas brasileiras, o Ministério da Educação assinou nesta quinta-feira, 20, uma parceria com o Conselho Federal de Psicologia. A parceria prevê um estudo sobre violência nas escolas, elaboração de materiais didáticos e formação de professores para o combate à violência no ambiente escolar.

Latitude influencia a regulação do sono


Latitude influencia a regulação do sono


  Pesquisas realizadas no Instituto do Sono (CEPID-FAPESP) revelam que pessoas que moram perto da linha do Equador tendem a acordar e dormir mais cedo

Leia em: http://agencia.fapesp.br/16187

Homenagem a Freud

Homenagem a Freud



  El 23 de septiembre se cumplen 73 años de la muerte de Freud. En vida de Freud y después de Freud, el psicoanálisis ha sido atravesado por diversas líneas teóricas y por diversas prácticas clínicas. Un enorme capital acumulado, pero no pasivo sino en permanente inversión productiva, que a veces hace olvidar que, hoy por hoy, los fundamentos son freudianos. Los fundamentos y el disparador…

Mulher, Cuide Bem de Você


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Seja um Terapeuta Melhor


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Dia Mundial da Saúde Mental


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